Em depoimento ao MPF, Mayra Pinheiro diz que os medicamentos ficaram rotulados por conta de questões políticas.
A secretária da Gestão do Trabalho e da Educação da Saúde do Ministério da Saúde, Mayra Pinheiro, que integrou a equipe do Governo Federal que visitou unidades de saúde em Manaus pouco antes do pico da segunda onda que atingiu o Amazonas, afirmou que o objetivo da missão era orientar os colegas médicos. Entre as recomendações feitas por ela estava o uso de cloroquina e hidroxicloroqueina em ‘doses seguras’.
As afirmações foram feitas em depoimento ao Ministério Público Federal ao qual o G1 teve acesso. O depoimento foi divulgado primeiro pelo jornal O Globo.
O documento faz parte de uma ação do MPF contra o ex-ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, o secretário estadual de Saúde do Amazonas, Marcellus Campelo, por omissão no combate à pandemia. Além de Mayra, são citados no documento outros dois secretários do Ministério da Saúde e o coordenador do Comitê de Crise do Amazonas, Francisco Ferreira Máximo Filho.
“A função das visitas era conversar com os colegas médicos, todos esses profissionais eram médicos, tentar orientá-los sobre o atendimento precoce na unidade, sobre todos os recursos que eles poderiam fazer para que a gente pudesse salvar mais vidas”, afirmou Mayra.
O remédio sugerido não tem eficácia comprovada cientificamente. Pelo contrário, a Organização Mundial da Saúde (OMS) publicou uma diretriz na qual pede que a hidroxicloroquina não seja usada como tratamento preventivo da Covid-19.
“A ideia era conversar com os colegas dada a desinformação muito grande de que a gente não precisa mais esperar para fazer exames, fazer sorologia, para a gente poder conduzir esses pacientes, para que os médicos não continuem insistindo que é para as pessoas ficar em casa, que nos primeiros sintomas eles tem que procurar a Unidade Básica de Saúde e deixar à disposição deles todas as medicações orientadas pelo Ministério da Saúde e que possam ser usadas para diminuir o número de mortes e internamentos”.
Questionada pelo MPF sobre a indicação de cloroquina e hidroxicloroquina, ela afirmou que foi dada aos médicos uma autonomia pelo Conselho Federal de Medicina para que pudessem prescrever medicamentos.
“A orientação do Ministério [da Saúde] desde maio de 2019, ele disponibilizou para os médicos brasileiros, para que de acordo com autonomia que foi dada a eles pelo Conselho Federal de Medicina, e a sua autonomia de prescrever e autonomia do paciente de querer, que eles pudessem orientar medicamentos com doses seguras, como a cloroquina, hidroxicloroquina azitromicina, que naquela época só tinha um comprovação in vitro e que hoje tem mais de 250 referências mostrando o potencial efeito dessas medicações, com estudos já ema elevada fase de evidência de que eles podem diminuir os internamentos e os óbitos”, afirmou.
De acordo com o depoimento, Mayra Pinheiro afirmou que um pesquisador em Manaus fez um estudo com cloroquina que levou à morte pacientes que receberam doses altas do medicamento. Ela refere-se à pesquisa da Fiocruz Amazônia, que estudou em 2020 os efeitos do medicamento. Por isso, segundo a representante do MS, havia uma preocupação com a automedicação.
“É necessário que as pessoas ao terem sintomas não fiquem em casa e procurem a Unidade Básica de Saúde e que os médicos possam ter conhecimento das doses seguras das medicações antivirais, para que eles não ofertem e aí eles causem dano ofertando doses que podem ter toxicidade, embora essas medicações sejam usadas, essas que estão na lista de antivirais, para tratar piolho, pediculose”, afirmou.
Em janeiro, a representante do Ministério da Saúde defendeu, inclusive em entrevista coletiva, o uso de remédio contra a malária para o tratamento de casos precoces de Covid-19.
Durante o depoimento, Mayra defende que os medicamentos ficaram rotulados por conta de questões políticas:
“Essas medicações, e não só mais a cloroquina, hidroxicloroquina, essas duas ficaram muito estigmatizados por conta de uma politização da pandemia, que é ruim para o debate científico, mas hoje a gente já tem dentro do leque de antivirais mais de dez medicamentos que têm evidências científicas, como a ivermectina, bromexina, colchicina”, afirmou.
A secretária insiste que a Organização Mundial da Saúde poderia liberar oficialmente o uso da ivermectina com ação antiviral. No entanto, desde outubro de 2020, a OMS já havia anunciado a ineficácia desses medicamentos no combate à pandemia.
Mayra Pinheiro disse ainda que os medicamentos são conhecidos pela impossibilidade de causar qualquer mal. Contudo, em março e em abril surgiram casos de pacientes que morreram após tratamentos de nebulização com hidroxicloroquina: uma mulher morreu em uma maternidade de Manaus e outra morreu também na capital, para onde foi transferida após receber o tratamento em Itacoatiara (AM).
“São medicamentos desprovidos de efeitos colaterais ou são mínimos e que têm potencial de diminuir o que todos nós mais queremos, evitar mortes e internamentos no sistema”, disse em depoimento.
Fontes G1amazonas.com